Diante de tudo, sou um rapaz evangélico, quase mudo, sentado nas coxas de meu pai, que me alisava por carinhos distantes, e eu deixava por que tudo ficaria bem, depois que eu aceitei tudo isso, não era difícil, apenas inconveniente para um jovem adolescente que não ouvia música, não era permitido o diabo e seus gritos dentro de casa, orava, e aceitava, deixava, como a nova estante da sala cheia de bibelôs e estátuas, para a ironia do pastor, imagem de santo não pode, mas um gato de louça de 1,99 tudo bem. Enquanto minha mãe alisava tirando o pó de seus enfeites, meu pai roncava no sofá da sala e o silêncio se organizava dentro de casa. Tudo em paz, como a bíblia quieta posada na nova estante da sala que fazia parecer que era a sala toda, uma nova compra. Comprei, inclusive um espelho, que eu me exibia nu, reclamando dos bagus no meio das pernas que não deveriam estar lá, inconveniente, e se isso cresce... Cresceu, no dia que meu primo me visitara vindo de longe com sua mãe e sua mala.
Mas não estava satisfeito, pois cada vez que ele entrara com o peso do seu corpulento, espremia o meu saco no colchonete que eu estava deitado e me incomodava que ele visse o meu pênis excitado, mas, ora, não seria assim se eu tivesse uma vagina, reclamei diante da imagem invertida do meu novo espelho, agora sem defeitos, mas aquilo no meio de minhas pernas...o defeito era meu. Quase cortei, mas fiz isso com a minha mão, fingi, apertando o pênis e puxando para dentro como quem esconde a espada, torci a coluna e fiz minhas ancas como uma menina de calcinha que meu primo inventara. Adorei, fiquei linda de menina, e aceitei, pois tudo ficara bem, no entanto entra meu pai no quarto e para seu espanto grita pelo diabo. Meu pai toma a bíblia na estante da sala e me ataca dizendo que não era digno de morar naquela casa. Sofri, mas aceitei ir como castigo todos os domingos aos cultos. Eu tinha uma espécie de surto quando o pastor orava, e eu me debatia, e me abria olhando para as câmeras de tevê. Aplaudiam todos em nome de Jesus e eu quando dava por mim o culto já havia terminado, mas não o problema de ter um pênis e um bagu.
Meu pai voltava pra casa me empurrando feito um brinquedo e trancava todas as janelas culpando as paisagens delas, inclusive as da tevê, mas agora eu tinha terno e gravata com cabelo bem cortado e sapatos lustrados, era engraçado perguntar ao meu pai sobre um versículo que eu havia duvidado e ele sem ser alfabetizado mantinha sua bíblia debaixo do braço, pois ele não sabia ler, coitado. Mas da pena que a todos sempre condena, pelo sentimento de dó que não vale a pena, eu havia definitivamente aceitado minha condição de homem masculino e único da família que havia sido letrado, faria tratamento na igreja, toda segunda-feira depois do colégio com um pastor muito sério. Era bonito, falava em línguas estranhas enquanto se aproximava de minha nuca e como remédio me lambia, enfiava as mãos no meu traseiro e dizia que era bom para um sujeito enfermo masculinizar-se primeiro. Nunca entendi o seu comportamento, mas me fazia bem. O pastor preocupado sempre dizia baixinho no meu ouvido do lado: não conte isso para ninguém, e eu nunca contei.
Mais tarde mostrei que era de confiança, evangélico que aceita e não reclama, e ele trouxe mais dois pastores para exorcizar o diabo afetado e efeminado que havia em mim, era engraçado quando eu falava de voz rouca e eles diziam que homem fala assim, mas eu estava tomado pelo suposto diabo e num quarto fechado com três pastores em volta do meu corpo, um orava enquanto o outro espera sua vez, alisavam o meu corpo, e de olhos fechados trocavam de lado e eu estava de quatro ouvindo palavrões. Eu gostava, mesmo que a bíblia condenasse as relações sem classe de um homem que se deita como mulher. Mas eles tinham certeza que sendo ativos me orando até o umbigo seria bom tratamento onde eu aprendo o que eles ensinam. Mas não sei se um dia me deito com um homem sendo eu o masculino. Acho que era isso que eles queriam que eu tivesse aprendido, não sei, toda vez que eu me tratava perdia o senso crítico.
Logo fiz cursinho, casei e me tornei pastor, mas ainda não tinha minha própria igreja e para minha surpresa veio minha mulher com dois filhos que eu não havia feito, mas que jeito, assim era o amor, então comecei ali mesmo como obreiro, carregava o dinheiro, e dos fiéis com seus louvores, eu carregava nos ombros suas dores e acreditava que um dia viria a solução pelo filho, na esperança que um dia, ele voltaria: Cristo nosso senhor. Mas senti que ele, Cristo, já voltou e falou aos meus ouvidos: filho a bíblia não é o único livro. Mas como, esse que fala não é o senhor, a bíblia é sagrada e não há outro livro que possa compensá-la. Mas a voz insistia e dizia que eu deveria estudar advocacia. Por direito, de tudo que sabia sobre teologia, na certa era um romano que impetuoso venceu a morte e se diz imperador. Eu não obedeci. depois me confessei ao pastor que riu de mim, seja o que for filho, um livro vai ser bom para ti, faça direito e entre na faculdade por que do conhecimento tudo vale, por que tudo é de nosso senhor. Senhor eu entendo que o senhor é um educador, antes de ser teólogo, mas eu não posso trocar o sagrado pelo direito de ser um advogado e ser for o diabo pedindo para ser defendido no julgamento dos homens condenados. Queima, seges mais rápido que o diabo, confia no sangue de nosso senhor e advogue com a orientação que deus lhe enviou. Aceitei, e me tornei cumpridor da lei.
Era estranho, pois toda lei já havia sido feita e eu advogaria para quem, já que o justo frequenta as igrejas e Jesus só condena quem vive em pecado o que eu defenderia como advogado recém-formado, talvez a cor, eu ainda acho justa as janelas creio que devem ficar abertas para a brisa que meu pai sempre ignorou. Logo veio a senhora doente, pedindo que eu a defendesse gratuitamente sua causa contra sua antiga igreja. Fora católica a senhora e depois evangélica apostólica, mais tarde heterodoxa, quadrangular de um retângulo luterano, quase um triângulo e ela passara por toda geometria, que decepcionada, reclama que o milagre não veio, mas agora que é verdadeiramente apostólica, do senhor com louvor, quer todo o seu dinheiro de volta que nas suas antigas igrejas replicou. Eu neguei, e não aceitei a causa, mas o meu pastor insistiu que deus lhe enviara no meu caminho para defendê-la das tais falsas igrejas e que isso era mesmo o meu destino. Lutei, aceitei como quem aceita um conselho convicto para agradar o pastor amigo que por muito tempo me tratou tornando-me correto na conduta do masculino. Fiz a nova lei: " Todo líder de igreja que prometer o milagre que não for cumprido passará o resto da vida em um presídio para expiar o falso de seu profeta endividado com o dinheiro do pobre fiel que lhe será devolvido " Essa era a nova lei, eu queria no mínimo a verdade. Mas o meu pastor, não sei por que, depois de ter me incentivado para ser advogado quase como um bom namorado, meu bom amigo, rompeu e gritou comigo: a verdade nãooo! E ele, depois do grito, depois disso, estranhamente, desapareceu, mas a lei, a lei foi aplicada e o dinheiro foi devolvido junto com tudo aquilo que na vida se perdeu feito fumaça no meu eu.
FIM
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beijão