O mosteiro de saturno / Ficção Científica


As naves de alumínio líquido se solidificavam no atrito do espaço se alinhando na forma de três conchas de masculino aço que acendiam no contato com os primeiros detritos que provinham de saturno, planeta conhecido por suas pedras que giravam esféricas, elípticas como escudos para intrusos humanos, mas logo os seres que exímios pilotavam os suprimentos, necessários para aquele mosteiro presidiário, pensavam sua estratégia, mentalmente, diante da nova física que concomitantemente existiam como naves e também como pedras, e assim eles se passavam por elas sem nenhum dano, impossível para o olho nu humano observar tal fenômeno, mas a nave e as pedras ocupavam dois lugares ao mesmo tempo no espaço como planos de consciência, que resistiam com sua própria frequência, independentes, sem um interferir no outro, e logo as naves pousavam trazendo os suprimentos necessários para aqueles pobres condenados, pena, pena o mosteiro azul profundo e escuro ter que existir num satélite para homens do crime, e não para a ciência de soluções tão popular no novo regime. O novo regime previa que toda ciência quando verdadeira traria soluções, mas ainda que neste futuro a nova ciência tenha descoberto a cura para os heterossexuais, ainda assim, os homens continuaram existindo. Então por decreto o homem foi preso, e assim se fez, na dobra, na dobra do espaço tempo que deixava o satélite invisível, transformaram o mosteiro em um presídio, de pedras azuis marinhas polidas com a forte gravidade de seus climas, lisas eram as paredes do mosteiro, retilíneas, e leves, muito leves diante do clima, ar irrespirável e tempestuoso, nuvens de gazes azul petróleo, como um céu contaminado, triste, e solitário. E o pobre condenado, novato, provavelmente entediado pela reza silenciosa que ele não entendia, confuso pela prisão sem julgamento, fugia, aos olhos nus dos seres da nave que descarregavam os alimentos e não se importavam com o tal sujeito, pois ele era objeto, apenas, e por mais desesperado que o ingênuo presidiário olhasse para os soldados com medo de ser pego, mais uma vez capturado, ninguém, nenhum soldado largava de sua disciplina de descarregar a necessária doutrina, era incrível, o nível de organização e foco tão necessário para levantar pesado fardo, fazer flutuar pela mente, em conjunto, em dupla de soldados que descarrilavam a água e a comida até o mosteiro, caixa a caixa, uma a uma, ficavam claras as regras onde o trabalho era mais importante que o próprio condenado que fugia, e fugiu, partiu, correu por um, dois, três segundos e pouco mais de cinco minutos não respirava, logo se sufocava arranhando o peito e caía morto, como objeto inanimado. desfigurado pelo pulmão entrecortado. Já os soldados com seu uniforme de metal líquido estranhamente flexível se protegiam daquela atmosfera agressiva e continuavam seus ritos de trabalho como uma oração tibetana, repetiam e se repetiam até o trabalho ser terminado. Quando se tem na doutrina o trabalho, como religioso sentido, a eficiência é a idolatria que se persegue em qualquer oração do dia a dia, mas é claro que se assim, acontecesse um erro, seria um grande pecado ou ainda considerado obra do diabo, mas não existiam regras sem razão, fora cortado toda decoração do rito em nome do tempo e objetivo conquistado, eles eram perfeitos, os soldados, concluíam seu trabalho em frações necessárias onde o tempo calculado era computadorizada matemática e nenhum policial soldado se importava com fugas em massa ou individuo que escapa, pois a condenação natural do tempo atmosférico faria sim ou não para aquele pulmão sem saída. E era sempre não, para qualquer condenado, já que o sim era mera dúvida, sutil, que talvez alguém, um dia, suportasse a densidade daquele espaço. Mais dois presidiários se exercitavam de frente para a parede do presídio como judeus que oram diante do muro das lamentações e lamentando seus ofícios, balançavam o corpo repetidamente para frente e para trás, para frente e para trás, dizendo: por que nos prenderam aqui, por que me prenderam aqui, por que nos prenderam...  e numa pausa de oração viram a fuga do amigo do presídio e a morte incomensurável, desmedida, daquele clima que não perdoa quem respira. Injusta é a morte, pois que régua pode medir tamanha tragédia daquela categoria, respirar é legítimo, disse um dos condenados, e o outro emenda, é mais do que isso, que sistema se sustenta sem o ar comprimido, corrido em nossas veias, pulsar é lícito, que dirá o coração, vamos condená-lo então? É claro que não, respondeu o outro, mas deve haver uma saída, relativa, pois se tudo está fechado é por que fora aberto um dia. Sim, mas não vejo uma porta, não vejo nada senão o peso escuro do clima lá de fora. Reclamou o presidiário desesperançado, e completa, que o que mais lhe angustia é estar preso naquele mosteiro sendo muito bem tratado, mas ainda condenado pela falta de resposta, pela falta de sentido, continuar como neste hospício sem um objetivo, apenas sendo preso, e nada mais do que isso. Somos presos, presidiários simplesmente, não há motivo aparente. É esta a condenação, pergunta um deles, estar preso sem saber?  Sim, mas por todos esses anos orando diante desta parede, eu descobri algo importante, eles não sabem. Eles não sabem? Pergunta admirado, indignado o colega presidiário. Eles não sabem por que nos prenderam aqui. Não é possível, deve haver algum saber. Diz o bom amigo largando do seu muro e insiste: mas alguém deve saber o motivo. Sim, esse alguém sou eu, finalmente eu sei, é o sistema. Mas que sistema, o não saber, o ignorar injusto, ser indiferentes a nós doentes pela procura, doentes da falta de motivo, doentes pela falta de resposta até que adoecemos pela angústia. Sim, não- saber é o sistema, é o novo direito, só não contavam com a angústia. Não entendo, por que a ignorância é um direito? Houve um tempo que pensei em minhas orações que o saber era perigoso, que eles estavam escondendo alguma coisa, ou que achavam que sabíamos demais...Mas...Mas não é isso, pois nem eles sabem, e é por isso que ignorar por completo os motivos trancafiando pobres coitados neste mosteiro faria de alguma maneira encontrar o real sentido, tanto que temos como regra obrigatória pensar a saída e nós daríamos a eles a resposta permitida. E que resposta seria essa que nos fosse permitida se eles nada sabem, quem tem autoridade para permitir tal resposta, ou prisão dessa filosofia. Ninguém, caro amigo, ninguém. Respondeu o colega e o outro encontrou uma solução, concluiu que, permissão, só lá fora pela morte, depois de morto, aí sim, justa é a salvação, deus, talvez daria resposta, resposta para tudo como permissão. Sim, mas não é isso não, houve um tempo que as igrejas e suas certezas, tudo se sabia, como nascer, crescer, e até morrer, salvo pela religião, mas não, não foi isso que aconteceu, foi guerra, civil e santa, mataram e morreram até que aboliram as certezas e fundaram o sistemas do não saber, a ignorância.  Mas e daí , isso não nos trás respostas, não responde a questão, por que nos prenderam aqui sem crime e julgamento?  Mas insiste e completa o colega de prisão: por isso mesmo, não saber virou um direito, sistêmico, e é por isso que estamos presos, sem saber, através da angústia que nos causa, encontraremos a resposta. Mas discorda o colega de presídio: que tolice, não pode ser, e se há alguma verdade nisso, não funciona como querem suas certezas, eu vou sair. Não saia, vai morrer, e isso é suicídio. A verdade está lá fora amigo, e não nestas paredes de mosteiro como um presídio. E saiu o presidiário motivado pela sua indignação e logo a atmosfera de inválidos invalidou o seu pulmão, morreu asfixiado como seu irmão e para a angústia do amigo os soldados não fizeram nada e nem ao menos viram a fuga de mais um na prisão. Triste pela perda do colega de cela, triste pela perda do colega de oração,  sentou e chorou enquanto se aproximava um policial fardado e como soldado lhe entregou um uniforme prateado para usar por cima de sua pele morena e cabelos crespos de profunda e cafuza descendência. Estranhou o condenado, mas disse o policial com sua missa que ele entendera que entre a ignorância e a certeza, vive a verdade neste sistema, e ele agora estava livre, para navegar no ambiente de outras atmosferas além do mosteiro de saturno no exercício diário e diurno, entremeios, como arqueólogo na busca de um sentido verdadeiro.  O policial creu e creram que aqueles condenados entendendo poderiam achar, e assim era o sistema, quem compreendesse a saída talvez encontraria como arqueologia da verdade o sentido de estar: livre. Assim, um condenado na sua busca encontrou a morte e o outro presidiário encontrou sua pena, que invertido virou policial e entrou para o sistema, e numa distração de sua corporação, apertou o botão, e explodiu o mosteiro para que ninguém mais fosse preso sem consciência, mas agora que ele era o policial, logo percebeu, que ele ainda estava preso, preso pela eficiência da busca de encontrar qualquer certeza.    

Comentários

como sempre muito bom vc lidando com as palavras ...

Beijão