"Mas olha só, que o português meio branco, meio negro, meio latino, pensa que é orixá, quer virar Ogum no buraco e aprender a magia vudu iorubá" Que jeito, é a política de preto, "Que esperto, branco azedo, leite passado, vai começar a dizer que Exu é o diabo" Sei que não é, pois Exu é apenas mensageiro, como hermes na política dos deuses gregos, "Bem, se sabes, diga pra mim, qual é a mensagem?" Que a verdadeira língua não é a tua e nem a minha, "E qual é a verdadeira língua, a tua política?" Ué, não viu o decreto, que decretou a igualdade pela ortografia, "Que bom que não retiraram a crase ou teria pago com minhas vistas" Pois é, e foi de cima para baixo e não de baixo para cima,"Tens razão, uma nova ortografia é a língua da política" Então, e se somos iguais por decreto, pela língua daremos as mãos? "Não" E por que não? "Por que antes da língua tem o homem que cobiça a língua feminina" Tudo bem, você preferiria uma língua feminina! "Iansã rainha!" Nem me fale dessa tempestade! "Calma, português, Santa Bárbara eu diria" É guerra que ninguém conserta essa linguagem primitiva "Guerra e religião" Religião é linguagem de sinais que ainda separa o claro do negro carvão. "O sul do branco sempre fora separatista" Mas isso é mais linguagem do sudoeste paulista. 'Mentira, e a poesia do nordeste, pelo sotaque, não se separa não?" Bem, e se você me der o mapa da Mina eu até proclamo pela pronúncia miúda a independência do sul de Minas. "Português, você quer ser o dono de uma vila rica." Negro, não é essa minha intenção, mas por favor me diga qual é o mapa da mina, onde foi que você encontrou essa pepita? "Eu não sei, quando vi encontrei na tua urina, fez um lago, bem aqui no meu buraco, escorreu e já virou riacho, agora garimpa." Mas é você o escravo, então me diga, que com o ouro explorado eu pago a tua alforria. "Português eu sou negro, mas não sou escravo, porém por simpatia eu conto para me livrar da tua companhia onde fica o tal riacho e você garimpa: fica lá" Lá aonde? "Lá, no reino de minha mãe orixá" Que orixá? "Oxum!" Então peça para ela e vá buscar. "Português o reino não é meu e sem pedir licença não posso tirar nada do lugar" Então deixa que eu peço. "Português, você não é do candomblé e está querendo roubar" Eu tenho o cabelo amarelo e aceito Oxum como minha mãe orixá, caso eu pegue alguma coisa ela nem vai notar. "Mas Português, cuidado, não olhe para o espelho de minha mãe Oxum no riacho dourado" Negro, tolo, eu olho para onde eu quiser, eu não sou subordinado. "Melhor eu te dar um travessão para marcar um diálogo" -Diálogo, com esse traço eu quero é mais cutucar aquele rio inexplorado. - Então vá! Mas tente ao menos conversar. - Com esse traço posso separar o que é meu do que já está coroado. - Nem quer marcar a mudança de interlocução entre o certo e o errado? - A urina é minha, então sou dono deste rio claro. -É teimoso, por que não monta com minha mãe Oxum um diálogo com este traço? - Não! -Tudo bem, quem avisa amigo é, então faça o que você quiser. - Ahhh, eu me vejo, como sou lindo diante deste espelho. - Deus, eu avisei, não olhe para o reflexo! -Eu me vejo e estou diante de mim mesmo! -Português... português... português, olha o que você fez, virou escultura de narciso e fez de mim um eco, português, português, português...
-Toda linguagem é imagem de minha semelhança. - Oh, deus, português, pensas que és um pintor holandês, pois se toda imagem fosse só tua paisagem, não existiria o tupi. - Fui eu que inventei a língua Tupi-guarani! - E o xaxado e o xixi! - Epuã jevy xonaro´i, jajeroy nhanderu oxa agwã / levantem-se guardiões e guardiãs para agradecer e dançar na linguagem da sagrada umbanda! - Que que é, eu me levanto por que é você quem manda, mais um pouco vai dizer que controla os caboclos de aruanda. - Quem controla é quem canta! Machadinha do cabo de ouro, é de ouro, é de ouro, machadinha do cabo de ouro, é de ouro, é de ouro, machadinha que corta a mironga é o machado de xangô. - Português, eu estou tremendo, vibrando, acho que estou recebendo... -Machadinha do cabo de ouro, é de ouro, é de ouro, machadinha que corta a mironga é o machado de Xangô! - Português, português, incorporei! Iêeeeee, iá, iá, iá, exe fio, que tempo tem na terra? - Salve caboclo, a lua é grande, e não obstante, qual o nome de voz micê? - Caboclo sete Cruz. - Sete Cruz, de quê, desculpe caboclo, mas isso é nome de Exú de umbanda, eu queria uma consulta com um caboclo de Aruanda. - Exe fio aqui é o que se chama Caboclo Cruz e Souza de Aruanda. -Mas pai, Cruz e Souza não era poeta? -Era, mas poesia também cura isso, fio, não dói aqui. - Dói aqui, dói ali, dói até para fazer xixi. - Voz tem problema de rim. - Rim, então essa pedra... - Não é de ouro. - Que canalha, esse neguinho é mentiroso! - Esse português toma um chá de quebra-pedra que a linguagem da escura mata é a poesia mais correta... - Caboclo, caboclo, espera... - Onde estou, recebi o santo? - Recebeu e entregou o que era teu. - E o que era meu? - A pedra! - Posso ficar com ela? - Pode, e vê se enfia ela na merda. - Eu sabia que você iria ficar chateado, por isso menti, pobre português adoentado. - Ora, eu que tenho dó de você. - E por quê? - Por que eu te dei a liberdade. - Português, pensa que sou um garçom, do francês, menino, que a tua língua adaptou por que te servia, a liberdade eu já tinha, e eu também dei para ti, aí sim, eu te servi, com a minha poesia. - Poesia, a verdade do poema era a doença, não era uma pepita e agora que sei a verdade, não existe mais motivo para essa linguagem. - E o que o senhor vai fazer? -Nada, não há nada o que fazer. - No futuro, talvez, escrever. - Para quê? - Alguém vai querer ler. - Quem, você? - Eu gostaria de saber como sabes escrever. - Para quê, logo as palavras serão abreviadas. - E por quê? - Por que ninguém tem mais o que dizer. - Ora, português, tem eu e você. - Ora você sabe que eu estou muito doente e um dia nós iremos morrer, eu e você. - Mas é por isso que se escreve, a alma fica presa na palavra. - E como sabes que é justa a palavra dada? - Ora, eu não sei. - E nem vai saber, por que não há nada antes da palavra. - Mas ainda assim é justo escrever. - Só se for a liberdade. - A verdade da liberdade da linguagem? - É, qual é? - Eu não sei. - Então não há liberdade para escrever. - Tudo bem, o que as pessoas faziam antes de ler e escrever? - Não sei, dormiam. - Então vamos dormir para saber. - Mas aí a gente sonha! - É isso, sonhar com símbolos para escrever!
-Símbolos da geometria como um triângulo sagrado - Disse bem, português, o grego de um triângulo equilátero - Negro, essa geometria é o grego de um triângulo equivocado - Equilátero é a igualdade dos lados, esse prefixo não significa lados equivocados. - Então, negro letrado, eu prefiro um quadrado, tem a linguagem da igualdade dos quatro lados. - Então eu prefiro o círculo, português, esse sim será igual para todos os lados. - Ora, negro, um círculo é só um buraco e ainda assim, preto, esse buraco não te daria a verdade da liberdade. - Tens razão e muito menos da sua linguagem. - Então não há mesmo nada o que fazer - Há sim, fugir, ou talvez permanecer? - Ou talvez, permanecer e inverter o espelho. - Inverter o espelho para quê? - Para saber a verdade da liberdade, a verdade da linguagem. -Não tem jeito, português, liberdade pela língua estamos presos. - Eu inverto. - Não faça isso português, vai ver tudo por outro lado. - É isso mesmo que eu quero, agora eu sei! - Você sabe, sabe o quê? - Eu sei, finalmente a verdade da linguagem. - E qual é a verdade da linguagem? - Tac- tic - tac - tic. - Um relógio, deixa que eu inverto: tic-tac-tic-tac. - Negro, é meu o espelho: tac-tic-tac-tic... - Não está correto, é tic-tac. - É tac-tic-tac-tic - Tic-tac-tic-tac... - Tac-tic-tac-tic - É essa a verdade uma figura de linguagem: o tempo! - Mas estamos felizes ou estamos presos. -Como tu já dissestes com o passar do tempo, morreremos. - Bem se é assim, que jeito, eu me deito. - Deitaremos...
-Para sempre juntos:-tic-tac -Tac-tic -Para sempre separados, tic-tac -Tac-tic -No final venceu a linguagem, tic-tac -Tac-tic -No final venceu o diálogo, tic-tac -Tac-tic Não tenho certeza-Tic-tac -Tac-tic -Mas, eu acho -Tic-tac - Tac-tic - tic-Tac...
-Português, por que sinto que com o tempo me separo? - Por que a língua separa qualquer sílaba da palavra. - Mas, português, eu ao menos ainda sinto que somos uma palavra: amor. - Engano seu, baianinho de óculos, você é apenas uma cor. - Que preconceito, eu já me sinto um sujeito, e lhe tenho caridade. - Caridade, o que você tem é cuidado, ainda é sujeito abstrato. - Sou concreto, tenho massa, e o logos da construção da razão e de minha palavra. - E qual é a sua palavra? - Justiça. - Justiça, nem o registro de um gramático impede o sol do sertão de evaporar o teu romantismo neste direito latino. - É verdade o sol do sertão é impiedoso, mas ainda digo, libertas que/a seras tamen. - Liberdade ainda que tardia não será justo, é atraso, frase de efeito num pano branco que um dia fora escrito, eu me ergo e tenho dito, Benedito. - Aonde vais? - Dançar, dançar para Oxalá. - Sem a lira da poesia eu não tenho como tocar para você dançar. - Não tenho tempo, com a seta do ponteiro na planta do pé, planto o compasso da língua neste sertão de seca poesia e te dou a verdade da língua! - Eu não quero a verdade da tua língua latina. - Quer, por isso pensou em justiça. - Eu não quero, quero que sobreviva. - Então dança e me acompanha! - Mas sem música? - Ora, Benedito, imagina! A mente também é língua. - Como assim, Joaquim, ninguém poderá ouvir. - Mas verás, que a verdade da língua foi o primeiro gesto quando esculpiu o ar, dança! - Danço, danço por que assim eu te acompanho, danço até um tango, só para ficar mais próximo da origem de tua língua, a argentina. - Mentira, você sabe que minha língua não é a argentina, ainda que haja muitos vernáculos do espanhol na minha língua, o que você quer é se enfiar no meio de minhas pernas, a tragédia, sem sambar na avenida. - Sambar eu não sambo, e não é por que sou preto e quero tua luz de branco que lhe acompanho com este terrível tango. - Eu te dou minha luz, eu te dou meu canto, o fado. - O fado? - Tem que seguir teu destino pouco solitário, pois se acreditas no diálogo, ai de mim. - Ai de mim, português, não vá Joaquim. - Sinto, sinto muito, mas tenho que partir. - Fica, não morras, resista. - Já resisti, minha luz está em ti como tua luz está em mim, tenho a alma negra, agora preta e civilizada, por tanto que contigo aprendi. - Bem, mas se é assim, eu sou iluminado, como um preto de alma branca, também civilizado? - Por caridade respondo vossa pergunta: és civilizado, mas não como um preto forçado pela língua que não é tua, pela cultura, do presente, futuro e passado, não, também não, és apenas uma estrela, negra, que com tua inteligência, absorve tudo de quem passa, todos somos assim, é a língua viva que conduz e também é conduzida num plano sem fim. - Ai de mim. - Ai de mim, preto, eu morro e você tem que seguir. - Português, não! Foi assim que vi muitos dialetos morrerem em mim. - Tudo morre e não há por que haver guerra, morro, morri. fim.
Português, vai ser assim, então por que a gente fala, por que eu aprendi, se o diálogo pela palavra não é o suficiente para unir o mar, deixar unica a palavra, de muitas mãos, justas, civilizadas, para erguer uma só nação, uma só carta. Já são 800 mil pretos, fora os brancos e vermelhos que confundem suas línguas nesta babel bíblica que só atira o arco, a flecha e a bala... Língua portuguesa, por que a gente escreve e fala, melhor é ser um ponto, seguido de outro, e outro, para ser reticências como fim... a verdade da linguagem é que agora a língua de um, nos faz dois, e é assim. E eu só sei que agora colorido em preto e branco, por caridade eu tenho que seguir, transformando, cai a luz em penumbra e fecha o pano.
-Ressuscitei!Ressuscitei! Ressuscitei! - Vale-me deus, cruz-credo, Ave-Maria! -Aha! Na hora do aperto o baianinho macumbeiro vira católico no jeito. - Meu deus, você não morreu? - Enganei você com meu sono de Morfeu. - Cabra, você estava dormindo! -Fingindo, como todo poeta fingidor, fingi tão completamente que fingi a dor que deveras sente. - Pessoa, do mal, enganou esse pobre coração mortal. -Mentira!Você sabia que a morte é a ausência da vida. -Então, português, você se ausentou! -Minha flor, estrela guia, vou lhe contar minha filosofia, de poesia pessimista, tudo é representação, não há realidade na vida, só vontade de potência onde o nada é o protagonista, viva! -Viva, pra quê se você em nada acredita? -Acredito que a verdade da linguagem é a mentira! -Mentira, então fingiu tão bem que todo mundo copia. -Copias, poesia repetida, -Afinal, português no que você acredita? - Vou explicar, a república existe no ar, como frases de efeito de uma retórica sofista, para perder ou para ganhar, tudo é jogo de linguagem e não existe caridade em nenhum centro espírita. - Não me diga!? -E digo mais, neguinho platônico, de nada adianta conversar num centro espírita, pois a única realidade da caverna é a sombra! - Pombas! Pombas-giras! - E a luz... -E a luz, diga. - Não existe, a unica realidade é um coco seco no canto da cozinha. - Creio em deus pai, você bebeu tua urina. -Sim, é maluco, como aquele teatro do absurdo. -Desconjuro. -Juro, é boa linguagem, fiquei rico, só cobrando isso. -Você é Judeu? - Que preconceito, sou cristão, pois a novidade do judaísmo é o cristianismo. -Não seria Jesus Cristo. - Ou o bandido! -Que isso!? -O bandido ser perdoado, essa é a novidade do cristianismo que eu lhe trago: eu te perdoo. -Eu não sou ladrão, e se toda linguagem é só representação, você representa o seu perdão, não é sincero. -Sou honesto. -Cheio de graça. -Ser honesto basta.
-Bem, português, pois se ser honesto basta, e você realmente não acredita em nada, siga tua ordem matemática. -Que ordem é essa? - Assuma o zero! - Eu não sou um zero! - O zero da matemática, afinal você não acredita em nada. - Eu acredito sim, eu sou o um. Um deus único e sem fim. - Então me conte da onde veio o um na linguagem matemática? - Não sei, veio do zero. - Não pode ser, o um não veio do zero por que o zero não é nada, está vendo sua linguagem é mentirosa e abstrata. - Eu vim do céu e tenho a palavra, logo me transformo em algarismo e faço chover prata. - Então faça, por que logo, logo, de tão seco vamos morrer neste sertão sem nada. - Chove, chuva de prata, que logo me cai do céu uma argentina paraguaia. - Que geografia é essa, uma argentina paraguaia? - Com licença, eu tenho a minha própria linguagem geográfica: toca guarânia e me traga uma cigana de saia rodada. - Lá vem você com a música dizendo que tem a palavra.- Música é linguagem matemática: vem cigana, vem cigana. - Ai de mim português, o que foi que você fez, eu estou girando e minhas mãos no céu estão bailando! -Vem cigana, vem cigana! - Português, para, com essa linguagem mágica! - Vem cigana, vem, que a solidão deste sertão ainda me mata, vem que eu te dou um rio de prata. - Que guapo, que macho, muchacho. - Linda cigana paraguaia. - Estou apaixonada, tome esse punhal de língua prateada. - Que lindo! Gracias - É para cortar palavras. - Obrigado, vou cortar a solidão como vocábulo da minha oração! Agora vá! - Fui; português, o que foi que ocorreu desta vez? -Eu sabia que você guardava um punhal de prata. - Mas é claro, eu caço com essa faca, corto o mandacaru para beber água.
Mentira, você guarda está língua afiada para cortar o princípio da palavra. -Oh diabo, como deus e o diabo na terra do sol, você enfia uma ideia na cabeça e uma câmera na mão e quer fazer um filme premiado, olha, eu não estou interessado na originalidade do pecado! - Fala, ou eu te corto em pedaços. - Pode cortar, mas só vai fazer do negrinho aqui um punhado. - Punhado de quê? - De átomos. - Não sou Demócrito, eu não estou interessado. - Então o que realmente quer saber? - No início, princípio dos fatos. - No princípio era o verbo. - E antes do verbo? - A luz, por certo. - E antes da luz? - A escuridão, como um negro carvão. - Carbono, é você! - Você o quê? - Tua física, explodiu em universais! - Oh, deus, português, minha língua nata não explodiu em nada, apenas fala - Não sei, estrela negra, tua língua se esconde e não me revela nada, então me diga! - Mas é você que me acusa, é você que deveria revelar a palavra. - Pois é, e eu não sei. - Eu também não sei, português, talvez a língua seja só um pouco mais de um simples traço. - Simples traço do quê? - De um ponto, dois pontos, sei lá, dois traços, dois pontos. - Dois pontos, dois traços, dois pontos, de quê? - De uma linguagem que se crê? - Mas o que significa? - Interrogação, código morse patrão! - mas isso é linguagem de guerra. - Então, não é essa a origem da tua questão, português orixá, tupinambá! - Eu não como gente! - Mas a tua língua come. - Não é a língua, são os ouvidos, eu ouço e falo. - E reconstrói a ordem do tempo e do espaço. - Eu não estou construindo nada, você que desconstrói quando fala, inventa gírias, negrinho de periferia e se distancia da correta gramática. - Então é este o seu problema comigo, é esta a questão? - Sim, tua crítica e interrogação! - Tudo bem, mas eu nunca te perguntei nada. - Uai, você não pergunta e também não responde quando fala. - Por que não estou interessado, nem na verdade, nem na linguagem, nem no verbo, ou no espaço, por que a unica coisa que existe é o meu buraco. - Então volte para o seu lugar e fique de boca fechada, calado. - Volto, como me encontrou no início, quieto e sem sentido ... - É isso, o silêncio, o silêncio é o princípio da verdade de qualquer linguagem. - Satisfeito, posso agora terminar a nossa história. - Pode, mas só uma coisa a mais... -E o que seria? - No silêncio, do publico que nos observa, no silêncio da plateia, qual é a consciência que existe lá?
-Ah, português, olhe para as tuas mãos, e se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina "da língua" e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer / leia as tuas mãos, elas são o teu vinho e o teu pão. - Que é negro, quer me dar sermão, é Antônio, é Vieira, eu leio as minhas mãos e vejo as veredas das sede e da fome de um homem do sertão -Sim, e talvez seja esta a sua consagração. -Negro, é o fim da questão, ler e escrever para dividir a minha língua é dividir a minha imaginação! -Sim, português, é o fim da questão. -É o fim da questão, você tem razão, eu cheguei para uma conclusão, então apague a luz e feche o pano, eu leio e escrevo por que literatura é mesmo a ciência do livro da minha imaginação!
-E agora português, o que vai fazer? - Dançar e cantar para crer - Crer em quê? - Na língua: Yanomami, Pataxó, Tupinambá, Guarani... - Que língua é essa? - É o tronco de uma língua esquecida, são muitos os galhos da linguagem indígena. - Mentira, você está inventando. - Eu estou cantando e dançando para reinventar a língua. - Não pode fazer isso. - Por que não a língua é viva! - Então eu também vou inventar uma canção e dançar numa nova mentira. - Não minta, cria, e se sua língua for bonita... - Acaba que somos aplaudidos. - E enquanto a luz se apaga... - A gente canta e dança nossa língua inventada:
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- Cantando e dançando, apaga a luz e fecha o pano.
FIM
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